sábado, 24 de agosto de 2013

Médicos Cubanos nas Corridas de Rua? Eu Quero!

Por Daniel X.

Com a chegada ao Brasil dos primeiros estrangeiros que fazem parte do programa Mais Médicos, as polêmicas a respeito aumentaram muito. Inclusive, com o presidente do CRM-MG fazendo sua declaração“Vou orientar meus médicos a não socorrerem erros dos colegas cubanos”.


Muito tem se questionado sobre esses profissionais estarem ou não aptos para exercer a medicina em nosso país, inclusive, alguns já foram suspensos; sobre exercício ilegal da medicina; sobre a verba do programa que seria repassada a Cuba, e não aos "4 mil escravos de jaleco"; e teorias da conspiração (das quais sou adepto), que alegam que esses profissionais seriam espiões comunistas.


Mas a questão é que, o fato desses médicos estarem ou não aptos para nos atenderem, me fez recordar alguns episódios que já vivi e presenciei nas corridas de rua.


Um desses episódios aconteceu após minha participação na maratona do Rio 2012, onde vim a ter um quadro de hipotermia minutos após cruzar a linha de chegada. Na ocasião fui atendido na tenda médica do evento e liberado. Vindo a passar mal posteriormente no aeroporto Santos Dumont, onde fui novamente atendido, só que pela equipe médica do local.

Quando cheguei em BH, fui direto para o hospital e doze dias depois,  já com cianose, taquicardia, Sat O2 alterada (inclusive com gasometria bem baixa), é que  foi diagnosticado o quadro de embolia pulmonar bi lateral.

O fato me gerou dúvidas e inseguranças quanto a eficiência dos atendimentos de urgência em eventos, uma vez que, quando fui liberado do posto médico da prova, ainda estava me sentindo mal. Vindo a ser atendido novamente no posto médico do aeroporto com quadro de hipotermia.

Cópia do relatório médico do atendimento no Aeroporto Santos Dumont em 2012 (clique para ampliar):



Além deste episódio, também em 2012, participei de uma corrida Cross Country (AQUI), onde eu e outros corredores viemos a ser atacados por um enxame de abelhas muito intenso. Muitas pessoas ficaram desesperadas, algumas vindo até a apresentar sintomas de anafilaxia, e a equipe que estava presente na ambulância não se mostrou muito preparada para o tipo de intercorrência.


Sendo atendido em hospital, após o enxame da Volta da Lagoa dos Ingleses

Muitos participantes questionaram sobre a falta de preparo dessa equipe de saúde. Então, o organizador publicou uma nota explicando que, a única legislação que determina o tamanho da equipe médica de um evento é o Estatuto do Torcedor (AQUI), que diz que o organizador deve disponibilizar uma ambulância, um médico e dois enfermeiros para cada dez mil pessoas e comunicar previamente à autoridade de saúde a realização do evento.

Quando fiquei sabendo do fato, achei absurdo, pois, corredor não é torcedor. Não estamos sentados numa arquibancada gritando, estamos praticando uma atividade física intensa, e por mais preparado que um atleta esteja, imprevistos acontecem.


Estatisticamente falando, será que o atendimento médico nos eventos tem sido eficiente? Quem fiscaliza isso?
Em uma matéria postada no site Webrun em 2010, o superintendente do hospital Hospital Nove de Julho, Luiz De Luca, afirmou que apenas 8%, em média, do orçamento das provas é aplicado em infraestrutura médica para o evento.

Na mesma matéria, o médico Rodrigo Nicácio, afirma que, “Qualquer evento com mais de mil pessoas no estado do Rio de Janeiro tem de ser submetido ao Corpo de Bombeiros e ao CRM (Conselho Regional de Medicina) no que diz respeito ao número de ambulâncias, número de médicos, número de enfermeiros.”


Este mês, no Mundial de Atletismo em Moscou, a atleta Beata Naigambo, da Namíbia, passou mal e caiu no meio do pelotão com apenas 16 minutos de prova e cerca de 5km percorridos, vindo a ser atendida  por uma equipe médica no mesmo local.

Se atletas profissionais, extremamente preparados, estão sujeitos a precisarem de atendimento médico em uma prova, será que com nós, amadores, é diferente?

Além dos casos supracitados, já  presenciei ou tomei conhecimento de inúmeros outros casos de atletas precisarem de atendimento em corrida de rua. Alguns desses casos vindo a ocorrer óbito, como na Volta do Cristo, na Corrida de São Silvestre, no triathlon na Lagoa dos Ingleses, e o caso recente do atleta que faleceu durante o C. Adidas, em Curitiba. Não que a causa desses óbitos tenha sido em decorrência de mau atendimento, mas a questão é: PODEMOS CONTAR COM O ATENDIMENTO MÉDICO NAS CORRIDAS?

Por experiência própria, não tenho mais tanta confiança em atendimento cedido por organização de evento.

Confira a matéria - Papo de Esteira: Seu médico está preparado? por Vivian Dombrowski


Seria bom se autoridades ligadas ao esporte reivindicassem uma proposta para regulamentação própria nas corridas de rua, e não usar um estatuto que não tem nada a ver com a situação. 

Em vários estados já existe a lei que torna obrigatória a disponibilização de desfibriladores cardíacos em estabelecimentos, entidades e eventos onde ocorram aglomerações ou o fluxo diário de pessoas acima 1.500 indivíduo. Mesmo assim, em algumas situações essa lei vem sendo descumprida.
Os corredores também precisam reivindicar um "Mais Médicos" por parte das organizações, mesmo que profissionais estrangeiros. Afinal, entre um médico "importado" e médico nenhum, prefiro a primeira opção.

Voltando à polêmica do programa "Mais Médicos", ainda não tenho uma opinião formada, mas acho interessante dar uma vasculhada nesses dados oficiais do Banco Mundial, onde podemos fazer uma analogia entre a saúde em Cuba e no Brasil. Além de outros dados que podem ser verificados no The World Bank: Data:


Expectativa de vida
A média de anos que se espera que um recém-nascido viva se os padrões de mortalidade atuais não sofrerem mudança.

Despesas correntes com saúde (% das despesas privadas com saúde)
Despesas diretas são quaisquer gastos diretos para suprir as necessidades domésticas, incluindo gratificações e pagamentos em espécie, pagamentos a profissionais de saúde e fornecedores de produtos farmacêuticos, aparelhos e outros bens e serviços cuja principal função é contribuir para a restauração ou a melhoria do estado de saúde de indivíduos ou grupos populacionais. É uma parte das despesas particulares com saúde.

Despesas com saúde, pública (% da despesa total com saúde)
Despesas com saúde pública consistem em gastos recorrentes e de capital orçamentário do governo (central e local), empréstimos e subsídios externos (incluindo doações de agências internacionais e organizações não-governamentais) e fundos de seguro de saúde (ou obrigatórios). Despesa total com saúde é a soma das despesas com saúde dos setores público e privado. Ela abrange a prestação de serviços de saúde (preventivos e curativos), atividades de planejamento familiar, atividades de nutrição e ajuda de emergência designadas para a saúde, mas não incluem o fornecimento de água e saneamento.

Essa não é a primeira vez que a Associação Médica Brasileira investe contra a "aquisição" de médicos  cubanos no Brasil. Em 2005, o governo de Tocantins encontrava dificuldades na contratação de médicos brasileiros para municípios mais afastados, e recorreu a um convênio com Cuba que enviou seus profissionais para atenderem no estado.

Quanto ao comentário do presidente do CRM-MG, deixo a minha dica:

Código de Ética Médica - É vedado ao médico:

Art. 33 - Deixar de atender paciente que procure seus cuidados profissionais em 
casos de urgência ou emergência, quando não haja outro médico ou serviço 
médico em condições de fazê-lo.

Código Penal brasileiro 

Art. 135 - Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
Parágrafo único - A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal de natureza grave, e triplicada, se resulta a morte.
Condicionamento de atendimento médico-hospitalar emergencial (Incluído pela Lei nº 12.653, de 2012)

Leia: O espírito da medicina cubana

Imagens:Google

Comente com o Facebook:

Um comentário:

  1. Com o perdão do trocadilho infame, um post matador. Parabéns por ele e pela reflexão. Na única vez em que precisei de atendimento, depois de uma palhaçada que resolvi fazer na chegada da Maratona de SP 2012 (saltei e no que caí, tive cãibra), fui bem e prontamente atendido. Mas acho que estamos longe do ideal, tanto nas grandes provas quanto nas menores.

    ResponderExcluir